“A bruxaria exploratória nas malhas da polícia”

a psiquiatria e a perseguição policial ao candomblé baiano entre 1920 e 1930

Autores

DOI:

https://doi.org/10.53727/rbhc.v18i1.1055

Palavras-chave:

história da ciência, repressão ao candomblé, imprensa, história da psiquiatria

Resumo

Este artigo tem como objetivo discutir como a repressão policial ao candomblé, ocorrida no século XX, especificamente entre os anos 1920 e 1930, que mobilizou a psiquiatria e a medicina para a criminalização dessa religião, tanto do ponto de vista penal quanto das batidas policiais. Para isso, realizamos uma análise documental de abordagem qualitativa, buscando demonstrar como determinadas notícias de periódicos de Salvador revelam indícios desse cenário. Ao mesmo tempo que reprimiu algumas práticas mágicas, reforçou a percepção de seu potencial perigoso e delituoso para a sociedade da época. Um dos desafios enfrentados pelos adeptos das religiões de matriz africana no século XX foi combater os discursos médicos sobre a loucura. Esses estudos buscavam se especializar cada vez mais e construir uma relação entre religiosidade negra e saúde mental, sob o pretexto de encontrar uma suposta cura. Os problemas espirituais eram quase sempre tratados como questões médicas. Era comum que candomblecistas fossem internados no Hospital Juliano Moreira, pois acreditava-se que a medicina poderia curá-los. Essa prática era bastante controversa, mas não faltaram pais e mães de santo que foram aos hospitais retirar seus “doentes”. A historiografia demonstrou que, durante a repressão ao culto de candomblé na Bahia, a polícia, por vezes, agiu de forma arbitrária, sem registrar, listar ou informar as autoridades competentes sobre suas ações contra o candomblé e outras religiões afro-brasileiras. Notificações e queixas raramente eram transformadas em inquéritos.

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Publicado

09-06-2025

Edição

Seção

Dossiê - Corpos e mentes sob escrutínio: saberes e práticas ‘psi’ na história das ciências